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Todo mundo é jornalista, menos quem é


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"Vivemos uma situação absurda: enquanto milhares de jornalistas formados estão desempregados por este Brasil afora, outros milhares escrevem em jornais e revistas, falam em rádios e tevês sem nunca terem assistido uma aula sequer em um curso superior de Jornalismo.
Estou falando de médicos, advogados, psicólogos, psiquiatras, nutricionistas, sexólogos, arquitetos, engenheiros, administradores de empresa, economistas, professores de Educação Física, escritores, modelos, atores, dançarinos, intérpretes, atletas e ex-atletas, técnicos esportivos, astrólogos, cozinheiros, umbandistas, médiuns, bispos, pastores, padres e religiosos em geral, costureiros, publicitários, marquetólogos, sindicalistas, fofoqueiros... e por aí vai.
Eles escrevem colunas, apresentam programas e, não satisfeitos em versar sobre sua especialidade, danam-se a informar e comentar os fatos como se lhes baixassem o espírito do Boris Casoy. Mascaram-se de colaboradores, apresentadores ou artistas e acabam exercendo, ou melhor, usurpando uma função própria de jornalistas.
Para mim, o mercado da comunicação deveria ser ocupado por profissionais da comunicação. Parece-me óbvio. Estuda-se para isso. Emprega-se no mínimo quatro anos da vida e um bom dinheiro para se ter um diploma que no final das contas não está valendo nada.
Se a maioria das faculdades de comunicação é uma porcaria, esse é um outro problema. Que se lute, então, para que o nível melhore, para que seus alunos tenham a possibilidade de sair mais bem preparados - ao menos com um inglês e um espanhol decentes e o início de uma especialização em Direito, Economia, Política, Artes e Esportes, ao menos.
O que não se pode é usar nossa pretensa incompetência em muitas áreas para inundar nosso mercado de não-jornalistas. Seria o mesmo que permitir a qualquer um exercer a Medicina e o Direito só porque também a maioria dos cursos superiores dessas profissões é um lixo.
Repito: deveríamos lutar mais pela melhoria da qualidade de ensino nas faculdades de jornalismo antes de abrir mão da obrigatoriedade do diploma - que interessa principalmente a patrões mal-intencionados, preocupados unicamente em criar formas de fugir das obrigações legais.
A não obrigaroriedade do diploma de jornalista só teria algum sentido se o mesmo acontecesse com as outras profissões. Por que um arquiteto precisa de um canudo, quando sabemos que muitos só assinam o projeto de outros, mais talentosos, que não têm o curso superior? Por que os médicos fazem lobby contra as medicinas alternativas, enquanto empanturram seus pacientes de remédios que muitas vezes aceleram a doença? Por que só advogados diplomados podem atuar, quando autodidatas são capazes de entender e defender as leis tão bem ou melhor do que eles? Por que um publicitário precisa de diploma quando a criatividade é um dom natural do ser humano?
O que acontece é que as outras categorias são muito mais unidas do que a nossa. Tente dar aulas de Jornalismo, por exemplo - mesmo que você tenha 26 anos de profissão, como eu, e trabalhado em todas as mídias e em mais de uma dezena de cargos, da reportagem à direção de redação. Já orientei com prazer muitos colegas em redações, mas não posso fazer o mesmo em uma sala de aula porque não tenho curso de mestrado ou doutorado. Isso é errado? Não. É ilógico, mas simplesmente é assim que funciona. Para dar aulas tenho de separar mais uns aninhos para adquirir a chamada formação acadêmica.
Tente ser técnico de futebol, você que acompanha o esporte há décadas, sabe de cor todas as táticas, assistiu milhares de treinos, quebrou a perna duas vezes jogando bola, fez curso de treinador, escreveu centenas de artigos e até livros sobre o assunto. Tem curso de Educação Física? Não? Então necas de pitibiriba. Nem adianta argumentar que João Saldanha, o treinador que montou a Seleção tricampeã no México era jornalista. Vão te olhar com o rabo do olho e dar um rizinho irônico. Estão errados? Não. Eles se movimentaram para proteger o seu mercado de trabalho, o que nós não fizemos.
Nós nos permitimos ser invadidos. Na verdade, o adversário era muito poderoso: nossos próprios patrões e sua visão pragmática da relação lucro-benefício. Eu senti isso na pele no começo dos anos 90, quando as transmissões de tênis pela tevê ganharam força e tive a ilusão de que poderia trabalhar seriamente como comentarista deste esporte.
Com um currículo que incluía a edição de quatro revistas especializadas, um livro, cursos, a cobertura de uma infinidade de torneios - entre eles o US Open de 1986 - e trabalhos como comentarista para as rádios Eldorado e Excelsior e as TVs Cultura, Manchete e Record, imaginei que tinha conseguido um lugar ao sol. Porém, da mesma forma que os convites choveram no início do boom, estancaram-se abruptamente. O que teria acontecido?
Elementar: ex-jogadores com negócios no tênis - como lojas, grifes e academias - passaram a se oferecer para atuar graciosamente como comentaristas. Na verdade eles só estavam interessados em divulgar sua imagem, ganhar prestígio, não precisavam de cachês ou salários, e isso os tornava bastante conveniente para as emissoras.
Esta situação continua. Há ex-atletas de outros esportes que não ganham nada para escrever em jornais ou revistas, mas usam o espaço para se promover e promover seus negócios. É uma situação que deveria ser denunciada e combatida. Muitos empregos se perdem por essa prática - que não interessa nem mesmo o leitor, pois essas colunas geralmente são vazias, descabidas e muito mal escritas.

(arrtigo publicado com a autorização do autor)


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