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Contra o mito da "nação bicolor"


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Durante a ascensão do nazismo, Albert Einstein teria respondido com as seguintes palavras à publicação do livro 100 autores contra Einstein, que atacava as suas idéias pacifistas: ?Por que 100 autores? Se eu estivesse errado, um autor bastaria?.

Situação semelhante teria ocorrido em 2006, em razão do projeto de cotas raciais em tramitação no Congresso Nacional. Intelectuais contrários à proposta, com 114 assinaturas, e entidades dos movimentos sociais favoráveis a ela, com 330 signatários, entregaram ao Congresso abaixo-assinados marcando suas posições.

Em agosto, veio a público o livro Não somos racistas
, cuja resenha intitula-se Contra o mito da ?nação bicolor? ? As falácias da política de cotas raciais na análise demolidora de Ali Kamel
. Segundo a resenha assinada por Jerônimo Teixeira, publicada na edição de 16 de agosto da revista Veja, embora exista racismo no Brasil, ele não predomina na cultura nacional e não é apoiado por nenhuma das nossas instituições públicas.

A proposta de uma política de cotas raciais representaria, portanto, a negação de uma tradição brasileira de miscigenação e convivência, criando uma divisão entre os negros oprimidos e os brancos opressores.

Apoiado na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD), do IBGE, a mesma fonte utilizada pelos defensores das cotas para afirmar que os negros são 48% da população e 66% dos brasileiros pobres, Kamel defende que os negros na verdade são minoria, e que a soma entre negros e pardos sim, resultaria na maioria dos pobres.

Para Teixeira, a proposta das cotas raciais deixa para trás a massa de 19 milhões de brancos pobres e não especifica se os mulatos mais claros serão favorecidos por essas políticas. A proposta estaria, no fundo, sugerindo que os cidadãos brasileiros sejam tratados de maneira desigual pelo Estado, desprezando o fato de que a pobreza e a concentração de renda atingem tanto brancos como negros.

Segundo o livro resenhado, a idéia de que o Brasil é racista foi inventada pelo sociólogo Florestan Fernandes a partir de 1950, e inspirou as políticas de ?ação afirmativa? implantadas depois pelo governo Fernando Henrique Cardoso. Naquele momento teria tido início uma distorção chamada por Kamel de ?nação bicolor?, que teve continuidade no governo Lula.

Essa discussão faz lembrar o prefácio da primeira edição, publicada em 1933, do livro Casa Grande & Senzala
, em que o autor Gilberto Freire fornece o pressuposto da argumentação construída pela resenha em foco: A escassez de mulheres brancas criou zonas de confraternização entre vencedores e vencidos, entre senhores e escravos
.


Entre os remorsos que habitam a memória brasileira e a eficácia com que os estudos de Freire marcaram a formação das nossas elites, ficou a certeza de que o Brasil resolveu satisfatoriamente as conseqüências da escravidão. Por isso, não seria lógico reivindicar reparação baseada no critério racial no país.

Entretanto, as falácias da resenha autorizam raciocínio diferente. Se a idéia de que o Brasil é racista foi ?inventada?, que racismo é esse que existe mas não é preponderante na cultura nacional? Mais: se essa invenção ocorreu a partir de 1950, contra o que se debatia a imprensa negra paulista nos anos 10 e 20, com a publicação de diversos jornais? E a Frente Negra Brasileira, entidade que reuniu tantos adeptos, atendendo uma demanda tão premente, que só não vingou como partido político porque foi dissolvida pelo Estado Novo de 1937?

A interpretação que Kamel e Teixeira fazem da PNAD também escorrega em distorções, já que a pesquisa não utiliza a categoria ?negro? em seus dados. A população brasileira é classificada pelo IBGE como sendo constituída de pretos, pardos, brancos, amarelos e indígenas
. Para os movimentos sociais favoráveis às cotas sim, pretos e pardos constituem a categoria ?negros?, incluindo os mulatos mais claros.

Além disso, por que será que um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil enumerados na Constituição de 1988 é promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação
? Convenhamos que não é lógico promover o que já existe.

Cabe lembrar, por fim, que a nossa Carta Magna deve ser interpretada também segundo o princípio da discriminação com rezoabilidade: tratar os iguais como iguais e os desiguais como desiguais. Se assim não fosse, haveria contradição constitucional na discriminação de sexo e idade para a investidura em alguns cargos públicos.

Como se vê, nem um, nem dois, nem 114 autores bastam para ?demolir? a edificação de uma sociedade livre, justa e igualitária
.



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