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O Populismo na Sociedade Brasileira (3): os anos de 1960
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Diversos elementos presentes nas análises de Germani e Jaguaribe encontramos também nos estudos de Francisco Weffort<1>. Populismo como manipulação, política não institucionalizada, sociedade em transição são elementos conformadores da análise weffortiana, como já foram nos outros autores. Lembro que o nosso interesse por esse autor advém do fato de ter se tornado paradigmático durante as décadas de 70/80 para a análise do processo político brasileiro pós-45 (quiçá pós-30). Weffort orientou direta ou indiretamente importantes pesquisas, especialmente quando a temática relevava a atuação de partidos políticos<2> e, principalmente, sindicatos<3>. O texto transcrito abaixo sintetiza traços essenciais do modelo explicativo: ?O populismo, como estilo de governo, sempre sensível às pressões populares, ou como política de massas, que buscava conduzir, manipulando suas aspirações, só pode ser compreendido no contexto do processo de crise política e de desenvolvimento econômico que se abre com a Revolução de 1930.? (p. 61) O populismo compreende uma ambigüidade: é estilo de governo sensível às pressões populares ao mesmo tempo que é política de manipulação. Enfatizar esse duplo aspecto demarca uma novidade no debate. A capacidade reivindicatória das massas é inexistente ou pouco sensível na explicação de Jaguaribe - massas amorfas vinculadas a líderes populistas agem de forma semelhante às clientelas coronelistas. Essa diferença, afinal, não é um aspecto menor, pois será elemento importante para a análise que Weffort elabora para explicar a crise do ?compromisso? populista, como veremos adiante.<4> Passemos ao segundo elemento da equação para, em seguida, voltarmos a essa questão. O populismo é a expressão de uma ?crise política e econômica?. Deriva de uma dupla condição: a decadência dos grupos oligárquicos ?como fator de poder? e a não existência de outro grupo que consiga imprimir direção ao Estado. Desta forma esboça-se uma ?crise de hegemonia? - nem as classes médias, nem o setor cafeeiro, nem ?setores agrários menos vinculados à exportação? são capazes de conferir ?legitimidade? ao Estado. À efetiva ampliação das bases sociais do Estado (classes médias e burguesia industrial) não é acompanhada pela hegemonização do poder por algum desses novos grupos (não conseguem ?apresentar seus próprios interesses particulares como expressão dos interesses gerais da Nação?<5>). Esta situação Weffort irá considerar como ?crise?, ou um ?vazio de poder?<6>. Sob esta condição se instaura um ?compromisso?. O Estado, que não é hegemonizado por nenhuma classe em particular será, a partir de 30, um ?Estado de Compromisso?. Por isso, por causa da instabilidade do equilíbrio entre os grupos dominantes, será necessária a presença das massas.
<1> O populismo na política brasileira, op. cit.. A nossa análise baseia-se nos três primeiros capítulos da Primeira Parte do livro. São versões modificadas de artigos publicados em 1963, 1965 e 1967, respectivamente. <2> Apenas cito o excelente estudo, clássico, de Maria do Carmo Campello de Souza Estado e partidos políticos no Brasil (1930 a 1964). São Paulo: Alfa-Omega, 1976. Ao meu ver a autora avança em muito em relação às teses ?populistas? quando aborda a dualidade do sistema institucional brasileiro. Ao analisar o sistema partidário associado ao processo de ?policy-making? estatal, conclui por uma situação de relativo alijamento dos partidos de importantes arenas decisórias, que seriam abocanhados pela burocracia estatal. Uma abordagem instigante, conferindo peso relativo aos dois sistemas institucionais - o político-parlamentar e o corporativo. Ao retomar, no entanto, a sua tese original em artigo de 1985, acaba por resvalar para a comparação desqualificadora: ?Parece claro, enfim, que tanto a organização de interesses como sua representação política não obedecem no Brasil aos mesmos moldes daquelas sociedades onde a integração política se baseia numa sociedade civil robusta que coloca obstáculos à manipulação e à repressão.? (grifo meu. ?A democracia populista, 1945-1964: bases e limites? em Alain Rouquié e outros. Como renascem as democracias, SP: Brasiliense, 1985, p.75). <3> Weffort tem estudos específicos sobre sindicalismo. Sindicatos e Política foi a sua tese de Livre Docência na USP, em 1972. Ver também: ?Origens do sindicalismo populista no Brasil (a conjuntura do após-guerra)? em Estudos Cebrap, n. 4, 1973. <4> Cabe a seguinte ponderação para relativizar essas diferenças. Apesar da série de argumentos utilizados para diferenciar coronelismo de populismo (Weffort, pp. 27 e 28), creio que na raiz de sua análise a problemática é a mesma da do clássico de Victor Nunes Leal (Coronelismo, enxada e voto, 1a edição 1949): como o alargamento do regime representativo não gerou aberta competição política conjugada com a organização dos grupos sociais envolvidos; isto é, a democracia representativa, na falta daqueles elementos, teria sido uma figura de retórica. Assim, a meu ver, o populismo seria uma atualização, em outros moldes (situação histórica, atuação política, relação padrinho-eleitor/ liderança-massas), do fenômeno coronelista. Repito, entretanto, que não estou desmerecendo as diferenças, em particular o fenômeno da emergência das massas na política, que suscitou a ambigüidade descrita por Weffort. <5> Não é demais lembrar que Gramsci é uma presença ausente no texto - não é citado uma só vez. <6> Por certo esta é a mais abstrata das categorias utilizadas pelo autor...
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